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segunda-feira, 10 de março de 2014

Secretary II - Capítulo 6


Carta na manga
(Músicas citadas no capítulo: Little Liar e Believe)



Demetria's P.O.V

Não sabia o porquê, mas naquela manhã acordei sentindo uma felicidade estranha. Era um sentimento nostalgico. Eu sempre conseguia lembrar dos meus sonhos, e alguns sempre ficavam martelando em minha cabeça durante um dia inteiro. Com aquele não seria diferente, aliás, seria muito pior; aquele sonho foi um tipo de aviso, eu sentia que algo dentro de mim havia despertado. Fazia tempo que eu não me sentia daquele jeito, sentia aquela estranha sensação de liberdade... 
Encarei o teto branco do quarto de Cassie e me perguntei se os acontecimentos da noite anterior também teriam sido apenas um sonho, mas eu não estava com tanta sorte assim. Com uma preguiça imensa, levantei meu tronco e sorrateiramente coloquei minhas pernas para fora da cama, levantando. Ajeitei minha blusa que estava totalmente amassada e caminhei com passos arrastados até o banheiro. Depois de uma preguiçosa higiene matinal, encarei meu reflexo no espelho. Nenhum resquício de maquiagem, nenhum sinal de vaidade, apenas o que eu realmente era. Não que eu não fosse uma mulher vaidosa, mas aquela imagem me trouxe inumeras lembranças; lembranças da época em que tudo era tão mais fácil, era só dar as costas aos problemas e milagrosamente eles deixam de me infernizar. 
Se alguém tivesse surgido a minha frente há alguns anos e me alertado sobre o futuro sombrio que eu teria, eu trataria de comprar uma passagem para o outro lado do mundo e começar uma nova vida. E talvez quando eu passei em frente a casa de uma "cartomante" e ela disse que queria conversar comigo, eu não deveria tê-la ignorado. Não que eu acreditasse em coisas daquele gênero, mas... 
Enquanto eu continuava a me olhar no espelho, me perguntei o que eu tinha me tornado. Era aquilo que eu queria? Foi aquilo que eu sonhei durante noites em claro escutando alguma música depressiva? 
- Não. - murmurei para mim mesma. Meu rosto, meu cabelo - apesar de maior e melhor tratado - e meu corpo ainda eram os mesmos, mas a pessoa na qual eu havia me tranformado às vezes aparentava ser uma completa estranha. A sensação de que você não conhece a si mesmo, algum tipo maluco de crise existêncial. De repente eu queria mudar, queria repaginar tudo aquilo que me cercava; não era como deixar de ser morena e tornar-se loira, nem cobrir o corpo com tatuagens, era mais como apagar o que você costumava ser e se tornar outra pessoa. Novos pensamentos, novas maneiras de agir diante das pessoas e talvez recorrer a coisas que se mantinham guardadas com carinho em sua memória. Pena que isso era realmente muito difícil. 
E então eu sabia o que tudo aquilo queria dizer. Eu sabia que poderia estar sendo precipitada, mas eu não era mais uma adolescente e o controle deveria estar comigo. Eu era uma mulher independente e não sabia o porquê de ter deixado que arrancassem aquilo de mim. 
Com mentiras. 

A simple question makes you look away
Your hesitation gives it all away
There's some protection in the way you move
If there's sadness in my eyes
It's coming from your lies


Ouvi um bater na porta do quarto e sai correndo do banheiro para abri-la. Cassie apareceu com um sorriso e uma roupa dobrada sobre seus braços. Encarei aquilo e depois balancei a cabeça, voltando para a cama e recebendo uma risada nasalada dela. 
- Vamos, se arrume! Não que eu queira meu confortável quarto de volta, mas você não pode ficar aqui para sempre. - ela estendeu as duas peças de roupa e eu peguei de má vontade. 
- O que faz você pensar que ele vai estar lá? 
- Assim como nós, ele sabe que os problemas pessoais precisam sumir quando o trabalho chama. Eu não acho que Joseph tenha feito algo absurdo ontem à noite, pelo menos eu não vi nada caótico no noticiário. - a loira riu e eu a acompanhei, examinando a roupa em minhas mãos. Estava frio naquele manhã, era incrível como o clima mudava tão drasticamente de um dia para o outro. Ainda bem que o frio me fazia bem. 
Ela ajeitou seu rabo-de-cavalo e me deu um olhar terno, saindo do quarto em seguida. 
Entrei no banheiro novamente, atirando o pijama no chão e tomando um breve banho. Saí com os lábios trêmulos e procurando desesperadamente por uma toalha. Depois de me secar e pentear o cabelo, deixando-o apenas parcialmente preso e fui até a cama pegar a roupa que Cassie tinha separado para mim. O bom de ter uma melhor amiga que tem praticamente a sua altura e o seu peso, é que você nunca vai olhar ao redor e perceber que vai ter de encarar o mundo nua. Ri com aquele pensamento e logo estava vestida. Fui até o espelho de corpo inteiro em um dos cantos do quarto e ajeitei a roupa. O casaco ficou um pouco comprido, mas a calça social preta descia modelando minhas pernas, então não ficou tão ruim. Calcei um par de scarpin que encontrei próximo a cama - feliz por saber que também calçavamos o mesmo número - e saí do quarto. 
Talvez fossem apenas as roupas de Cassie provocando aquele efeito, mas eu realmente comecei a me sentir diferente. 
Enquanto eu descia as escadas, o sonho veio em minha mente e novo e eu senti a nostalgia gostosa de antes. O melhor de tudo era que o sonho não foi simplesmente uma coisa irreal, foi um acontecimento que eu realmente vivi. 
- Bom dia! - Jared disse alto, segurando uma caneca e minhas narinas captaram o cheiro do café. Respondi com um sorriso e fui até a cozinha, onde Cassie comia uma salada de frutas. 
- Hey, o que você quer comer? 
- Não quero comer. - senti meu estômago protestar e então me dei por vencida, pegando uma torrada na mesa e um copo de suco de laranja. Jared adentrou o cômodo e colocou sua caneca na bancada, ajeitando os cabelos e procurando por algo nos bolsos de seu casaco cinza. Ele e Cassie trocaram um olhar de dúvida e eu cruzei os braços. 
- Ok, eu sei o que vocês estão querendo dizer com esses olhares. - alertei. - Mas tudo bem, eu vou ter que encarar o Joseph algum dia, não vou? Então parem com esse drama e vamos logo! 
Cassie terminou de comer e Jared andou apressado até o lado do fora da casa. Segui-o e fiquei esperando no jardim, enquanto ele ia pegar o carro. Cass parou ao meu lado e admirou minha roupa, como se ela nunca a tivesse visto antes. Assistiamos o carro de Jared ficar mais perto. 
- Então, você tem ideia do que vai dizer ao Joseph? - entrei no veículo pelo banco de trás e Cassie ficou no do passageiro. Ergui meu corpo, aproximando-me dela para falar baixinho. 
- Logo você vai saber. 

Encarei a fachada da Empire e senti meu estômago dar uma volta. Tudo parecia estar normal por ali; algumas pessoas entravam e saíam, os porteiros e os guardas estavam em seus lugares de costume. Pensei em ficar dentro do carro de Jared, mas Cassie abriu a porta de trás e me puxou pelo braço. Entramos juntos e fomos até o elevador de sempre. Enquanto estava lá dentro, tentei memorizar as palavras que eu soltaria nos próximos mínutos. Aproveitaria também para olhar aquele corredor pela última vez. Eu tinha passado por aquele corredor tantas vezes, e, em um dia simples, tudo mudou. Cassie se despediu de nós quando o elevador abriu suas portas e uma voz computadorizada anúnciou o andar em que eu e Jared deveriamos ficar. 
- Tudo bem, Demi? - ele parecia calmo, mas eu tinha certeza que conseguia sentir minha tensão. 
- Vai ficar, vai ficar! - mas eu não tinha mais certeza de minhas próprias palavras quando terminei de atravessar o corredor e percebi quem estava lá. 
Joseph tinha os olhos perdidos em alguns papéis. O terno e a gravata eram pretos como sempre; seu cabelo já fora mais arrumado e duas marcas roxas jaziam em baixo de seus olhos. Senti-me mal por ter dormido bem e até ter tido um sonho tão agradável; a situação dele entregava que havia passado pelo contrário. Jared me lançou um olhar amigo e entrou em uma sala que ficava ao lado de onde eu estava. Assim que bateu a porta, Joseph levantou o rosto e seu olhar me encontrou. Não, ele não se assustou com a minha presença, parecia aliviado. Deveria estar esperando desesperadamente que eu chegasse logo. Se levantou de sua cadeira e caminhou até mim. Fiquei firme, com os pés colados no chão, encarando o piso escuro. 
- Que bom que você veio! - senti pesar em sua voz. E eu estava para derreter feito manteiga. Continuei cabisbaixa até sentir seu dedo gelado encostar em meu queixo e levantar meu rosto. Foi então que mais uma vez eu me vi perdida naquelas íris verdes e carregadas de lamentação. Ele estava tão acabado! 
Minha vontade foi de abraça-lo, mas não... Não era o que eu deveria fazer. Eu não tinha ido até lá para simplesmente abraçá-lo. 
- Diga alguma coisa! Não, melhor, deixe que eu diga. - puxou-me pela mão e eu o segui até sua sala. Chegando lá, ele trancou a porta e eu me encostei à sua mesa. Fiquei olhando seu rosto, sem expressão, apenas esperando suas palavras. 
- Então... - comecei, ficando impaciente com o silêncio. Joseph estava encostado na porta, estranhei não ter se aproximado. 
- Posso pedir desculpas por ontem? Eu não sei o que me deu! - gesticulou e de repente o ar dentro da sala ficou mais frio. 
- Não sabe? - indaguei. 
Demetria, você tocou em uma ferida que não está totalmente cicatrizada ainda. E sobre o jeito como eu te tratei... 
- Não se preocupe, Joe. - sorri tristemente. - Não é como se eu não conhecesse aquele seu lado. Já fui tratada daquela maneira muitas vezes, se recorda? 
- Sim, mas aquilo acabou! - Joseph se aproximou e ficou com o corpo praticamente colado ao meu. Segurou minhas duas mãos, senti seus dedos fazendo carícias pela minha pele. Maldição, o toque dele fez tudo sumir da minha mente. - Eu não quero voltar a ser o que eu era! Antes eu não tinha certeza de nada, e agora eu tenho. - encarei nossas mãos juntas. As alianças. 
- Não é estranho que de repente não estamos agindo mais como casados? 
- Você está ouvindo o que estou dizendo? - ele colocou uma mão em minha nuca, puxando meu rosto para mais perto do seu. - Eu quero que nossa vida continue a ser bonita. 
E eu quero demissão. - disse simplesmente, percebendo ele soltar minha mão e minha nuca. Me olhou incrédulo. - Você vai acabar com tudo isso mesmo, não vejo motivos para continuar sendo sua secretária. 
- Por que diabos você está agindo tão friamente? 
- Acho que para combinar com o clima lá fora. - apontei para a janela, passando por ele. Segurei a maçaneta da porta e a girei. Ele não tentou me impedir como na noite anterior, mas algo me fez parar no meio do caminho e então dei alguns passos retardados de volta à sala. - Estou falando sério, não espere me ver por aqui de novo. 
- Dane-se isso, Demetria! Eu só quero saber o que aconteceu com nós
- Não aja como se você não soubesse. - meus dedos nervosos brincavam com os botões do casado. - Espero que você perceba que ainda pode remediar isso. Talvez ainda não seja tarde demais... - não expliquei o que eu queria dizer. Sentia que no fundo ele sabia exatamente. Sim, estavamos casados, mas isso não melhorava absolutamente nada. Se estivessemos juntos pelo matrimonio há anos, eu poderia dizer que crises como aquela eram normais, mas não fazia nem um mês em que o "sim" foi trocado e já estavamos daquele jeito. Além de que não era um problema de rotina; uma discussão por deixar a toalha jogada pelo chão ou por esquecer de fazer o jantar... Era algo muito mais sério. 
- Eu só queria que... - não esperei ele terminar sua fala, bati a porta com força. 
Se eu estava sendo dura demais com ele? Sim! 
Minha sede pela verdade era a culpada. 
Não me preocupei em avisar Cassie e Jared - e nenhum outro funcionário - que estava saindo da empresa. Quando cheguei ao lado de fora, levantei meu rosto para encarar aquele prédio talvez pela última vez. Pelo menos era a última vez que eu me sentiria parte daquilo. Aquele foi o lugar em que eu me apaixonei cegamente por um homem que mal conhecia. E poderia dizer que tinha me ferrado por isso, pois ele não era quem eu imaginava. Mas também poderia dizer que havia tirado a sorte grande ao descobrir o que suas máscaras escondiam. Eu não sabia o que vinha a seguir, não sabia o que seria de meu casamento e preferi nem ficar divagando sobre isso. Logo a sensação boa de antes tomou conta de mim de novo e eu sabia a direção de meus passos. 

The faces all around me they don't smile they just cry.


Eu caminhava aliviada pelas ruas movimentadas do centro de Londres; todavia, apesar do alívio, eu tinha certeza que minha expressão era vazia, assim como todas que passavam apressadas por mim. Pessoas afundadas em seus próprios problemas, os problemas dos outros pouco importavam. Pena que eu parecia estar mais perdida nos problema dos outros do que nos meus. Há anos. Estava com fones nos ouvidos, e a música que tocava funcionava como uma trilha sonora para os meus pensamentos. Eu não era mais a secretária dele. Sentia que aquela profissão nunca tinha me pertencido de verdade. Me tornar aquilo talvez fosse uma simples parte de um combinado de anos atrás. 
No fundo eu queria que tudo voltasse ao normal. Droga! Joseph era meu marido, não fazia sentido estarmos separados daquele jeito, de uma maneira tão rápida e devastadora. Mas tinha a omissão dele, e isso não deixaria que as coisas voltassem ao normal. E para completar também tinha Cameron e Carter naquele jogo
Confesso que nem estava me importando com os dois naquele momento; a excitação pelo que eu faria era a única coisa que merecia minha atenção. Não, eu não poderia desligar meus sentimentos, mas poderia pausá-los e pensar com clareza em uma solução melhor. 
Porém, não deixava de ser estranho me sentir tão... forte de novo. Onde estava a Demetria que provavelmente nem teria saído do quarto da amiga mais cedo? Onde estava a Demetria que preferia engolir suas palavras e esconder suas vontades para satisfazer o homem que amava? Onde estava a Demetria que não passava de uma masoquista? 
Eu não sabia, e nem queria saber. 
Uma pessoa procura fugir do que a atormenta, não importa de quem ela tenha que se afastar e isso, com certeza, era uma opção extremamente plausível. Se eu fosse uma egoísta, já teria me livrado de tudo; mas os problemas dos outros se sentiam atraidos por mim e eu precisava de uma formula para afastá-los. 
O que eu estava fazendo era um exemplo de pura covardia... Fugir daquela maneira de Joseph, não me importar em consertar o que provocamos por estarmos de cabeça quente... 
A explicação para tudo aquilo era bem simples: Eu era um ser humano como qualquer outro. Não, eu não tinha super poderes e nem o controle sobre os problemas. Todos acabaram depositando esperanças demais em mim e realmente acreditaram que eu era aquele projeto de mulher ingênua e sempre disposta a ajudar. Dane-se. Uma vez que você desiste de quem é, não adianta mais voltar atrás. 
Não era errado que eu me recusasse a aguentar o martírio que infestava minha existência. 
E como um antigo amigo dissera uma vez: O importante é como você se sente no final do dia. Agindo certo ou errado, o importante é o que a sua consciencia tem a dizer. O resto, definitivamente, é resto.

So give me something to believe
Cause I am living just to breathe.


Depois de uma torturante parada na casa de Joseph - minha também, que seja - para pegar chaves e meu celular, sorri ao avistar a casa que eu vivia antes. Meu carro ainda estava na garagem e diversos pertences meus ainda estavam ali; a mudança ainda não tinha sido completa. Meio cansada por ter andado mais do que estava acostumada nos últimos tempos, abri a porta e senti saudade de tudo que vi ali dentro. Ter conseguido aquela casa - e principalmente ter conseguido mantê-la - foi um dos sonhos que eu consegui realizar. Ela era totalmente minha, e eu me sentia super confortável ali dentro. Era o meu mundo. Lá dentro eu podia me afastar de tudo e todos e ser apenas quem eu queria ser. Depois de passear para matar a saudade dos cômodos, subi as escadas de dois em dois degraus, abri a porta de meu quarto que ainda estava com todos os móveis e fui a janela, erguendo-a para o ar correr um pouco pelo local. Saí do recinto e fui em direção a outra porta. Era um quarto que eu usava para guardar bagunças, ou coisas que eu não queria ter que ver todos os dias; tinha uma pequena comoda e um sofá onde caixas e mais caixas de papelão estavam empilhadas. Sorri e peguei uma das caixas, indo para o meu verdadeiro quarto de novo. Coloquei o objeto de papelão na cama e sentei-me na mesma. Puxei as aberturas da caixa e senti aquele típico cheiro de coisas velhas e mofadas. A primeira coisa que meus olhos avistaram foram diversos papéis amarelos. Peguei-os e corri meus olhos pela minha caligráfia de anos atrás. Ri sozinha enquanto lia aquelas letras de músicas. Meu Deus, tão carregadas de amor-não-correspondido e desejo de vingança adolescente. Em seguida retirei de lá algumas fotos que tinham as pontas rasgadas devido ao tempo. Algumas com minha mãe e Peter, outras com colegas que eu nem sabia onde a vida tinha-os levado e uma última que me fez lembrar do sonho novamente. Separei aquela fotografia e guardei o restante das coisas dentro da caixa, deixando em um canto do quarto. 
Fui até meu closet - que estava quase vazio - e procurei por certas peças de roupa com os olhos. Retirei uma calça jeans preta e botas de cano curto também pretas. Procurei mais um pouco e encontrei o que faltava: uma camiseta preta justa e básica, uma camisa quadriculada em tons de bordô e preto e um casaco de couro para enfrentar a baixa temperatura - que eu rezava para ainda me servir. Comecei a tirar a roupa social que usava e logo estava vestida com a roupa que era totalmente diferente da pessoa que eu tinha me tornado. Simplesmente não combinava com a nova e elegante Demetria. Coloquei a camiseta por dentro da calça e finalizei com um cinto metálico. Apesar das roupas estarem levemente apertadas, aquilo não me incomodou. Lembrei-me de tirar também uma pequena bolsa do closet e coloquei a foto que tinha separado lá dentro, saindo do quarto e batendo a porta. 
Logo eu estava dentro de meu querido carro, traçando um destino em minha cabeça. 
Girei a chave na ignição e logo me vi distante de minha casa de novo. Era bom poder me sentir indepente novamente; usando meu carro e roupas que eu não pensava em usar há anos. Durante um sinal vermelho, abri minha bolsa e tirei de lá um par de luvas pretas. Coloquei-as rápidamente em minhas mãos e voltei a me concentrar na rua movimentada em que estava. 

Depois de algum tempo, eu já estava em Kensal Green, que ficava a oeste de Londres. Pedi algumas informações pelo caminho e logo estava diante à entrada do Kensal Green Cemetery. Aquela típica sensação incomoda que deveria abater todos ao estar frente a frente com um cemitério passou por mim e eu a ignorei. Estacionei em um lugar próprio, peguei minha bolsa e saí do carro. 
Passei pelo enorme portão de ferro e avistei várias árvores que deveriam ser carvalhos. Tudo parecia parado lá dentro, exceto por uma ou outra pessoa solitária que estava parada diante de algum túmulo, ou um coveiro que transitava pelos corredores das lápides. Eu caminhava pelo chão rústico que se misturava com uma grama descuidadamente crescida. Se minha memória não falhasse, eu sabia que precisava andar apenas mais algumas quadras para chegar em meu destino. E eu estava certa, logo que avistei aquele nome, parei em frente a lápide e fiquei encarando-a séria. Depois de um tempo, olhei ao redor e percebi que estava sozinha. Me abaixei e comecei a tirar algumas ervas daninhas que cresciam pelo mármore que revestia o túmulo dele

Vincent Lewis

1981 2003

Amado filho, amado amigo.
Desde aquele maldito ano de 2003 eu me recusava a pensar no que acontecera com Vincent. E não só o que tinha acontecido com ele, mas também todo o resto. Se me perguntassem o que nós dois éramos, eu não saberia responder. Uma coisa mais forte que a amizade, porém diferente de amor; aquele amor que um homem sente por uma mulher e vice-versa. Vincent Lewis foi uma espécie de anjo que apareceu em meu caminho, e muitas coisas das quais eu havia aprendido durante a vida fora graças a eles. Depois de deixar seu túmulo menos mal cuidado, comecei a pensar de novo sobre tudo que estava acontecendo. Pensei sobre o sonho bonito que tive naquela manhã: Ele me esperava em um lago não muito distante de onde moravamos e, assim que me aproximei dele, comecei a reclamar sobre como a vida era injusta comigo; ele me abraçou e disse que eu era forte demais para me lamentar por coisas insignificantes como aquelas. 
Era difícil de acreditar que tanto havia mudado. E naquele momento eu senti falta de quem costumava ser. Lembrei-me da última conversa que tive com o homem que já não pertencia mais ao mundo dos vivos. De algo que eu havia prometido... 
- Me desculpe, Vincent. - eu disse baixinho, encarando brevemente o céu acinzentado. - Eu acho que não posso mais manter minha promessa. 


Cameron's P.O.V

Estudei os materiais em minha frente e balancei a cabeça de forma negativa. Tudo bem, era algo que eu gostava de fazer, mas era um tremendo desperdício de tempo. Ignorei meu lado negativo e sentei-me em uma banqueta de madeira. Arrumei alguns objetos em uma mesinha também de madeira que estava ao meu lado e ajeitei o cavalete. Depois de preparar o pincel, a palheta com as tintas e me certificar de que o godê estava a meu alcance, encarei a tela irritantemente branca. Tentei olhar para ela como se já conseguisse ver algo pronto ali. Eu não precisava decidir o que queria pintar, eu sabia o que ia pintar. 
Com todos os detalhes em minha mente, posicionei o pincel e comecei a me entregar à pintura. Pois é, quem imaginaria que Cameron Wolfe gostava de pintar e até já pensou em se tornar um pintor? Aquilo me acalmava desde pequeno e era algo que eu não abriria mão apenas para não ter que ouvir comentários idiotas. Ainda sentindo um leve incomodo em meu nariz devido ao soco que tinha recebido na noite passada, tentei me concentrar sem sucesso. O que eu estava fazendo com Demetria, afinal? Ela me fez pensar de modo diferente quando perguntou se eu queria acabar com sua vida de novo, e eu fingia que aquela expressão em seu rosto tão bonito não me atingia. 
Sinceramente falando, eu me sentia muito arrependido. Oh, merda! Se eu pudesse voltar no tempo... Tudo estaria diferente, eu tinha certeza. Ela não teria que passar por aquelas coisas, não estaria envolvida com situações perigosas. Não estaria com o Jonas. Ela estaria comigo e o sofrimento não a pegaria daquela maneira. Uma das minhas piores certezas era de que Demetria realmente sentia algo muito forte pelo Jonas, e com isso eu não poderia lutar. Claro, não poderia lutar contra o que ela sentia por aquele homem, mas poderia lutar para trazer de volta o que ela sentia por mim. Se eu estava convencido de que os sentimentos da Demetria adolescente ainda estavam presos no interior da Demetria mulher? Sim, era óbvio. Poderiam dizer que homens não reparavam em certos detalhes, mas eu reparei em como ela ficou nos dias em que eu me aproximei. Sentir ódio é diferente de sentir medo por estar atraída. Não, eu não era convencido, apenas enxergava a verdade.Joseph tinha o coração dela, e eu... Bem, eu tinha memórias e algo que poderia me ajudar muito. Era um segredo grave, algo que Carter me obrigou a manter em sigilo absoluto durante todo o tempo, e eu não podia fazer mais nada a não ser usar aquilo para o meu benefício. Quem se importava em ser bom ou não com as pessoas? Isso não existia mais. Cada um lutava para ter o queria; era uma guerra sem regras. 
E uma batalha daquela guerra já era minha. 
Cam? Você está aí? - rolei ao olhos e larguei o pincel, desistindo de vez. 
- Estou! - observei Elizabeth - eu não a chamava de mãe - entrar em meu quarto e me olhar em dúvida. Ela podia ser menos parecida com o filho, não? Às vezes eu não gostava de olhar para a cara daquela mulher simplesmente porque me sentia olhando para o próprio Joseph em uma versão mais velha e de saia. 
- Gostaria de conversar com você sobre ontem à noite. - ri com escárnio e apontei para meu nariz. 
- Ah, claro! Elizabeth, seu filho é a personificação dos bons modos! 
- Não estou aqui para desfrutar de sua ironia, Cameron. - ela me repreendia com o olhar. - Quero saber o motivo daquele... Incidente. 
Joseph é um animal, você sabe disse. - sentei todo largado na cama e observei ela andar de um lado para o outro do quarto. Não entendi o motivo da esposa de meu pai mostrar preocupação com o filho. Ela sempre pareceu não se importar. 
- Eu sou paciente! Vou ficar aqui até conseguir o que quero. - ela se sentou ao meu lado e eu levantei uma sobrancelha. 
- Isso é preocupação com o Jonas ou comigo? 
- Com os dois. 
- Então tá... O motivo daquilo se chama Demetria. - eu disse por fim, e ela pensou por alguns instantes. 
- A esposa dele? 
- Sim. 
- O que você fez, Cam? - claro, eu é quem tinha feito alguma coisa. Ela não poderia sequer pensar que seu filhinho era um revoltado que não sabia lidar com a verdade. Eu poderia acabar com a vida dele se eu quisesse. E olhando para sua mãe, que me fitava com aqueles olhos extremamente e irritantemente familiares, eu tive uma ideia. 
- Eu não fiz nada. Demetria apenas deve ter se assustado com o comportamento do marido e o mesmo achou que a culpa era minha. - Elizabeth se levantou sem dizer nada e logo saiu do quarto. Ótimo, pensei, agora tinha mais uma pessoa para se preocupar com a sanidade dele. 

/Cameron's P.O.V

Demorei um pouco no cemitério. Eu tinha consciencia de que apenas os restos mortais de Vincent estavam lá, mas eu gostava de pensar que ele me ouvia. E eu torcia para que, onde quer que estivesse, me perdoasse por quebrar aquela promessa. Mas eu não queria pensar em promessas. Estava com fome e então lembrei de um bom restaurante que ficava naquelas redondezas. É, aquele era o dia de fazer um tour pelo passado. 
Estacionei meu carro em frente a um pequeno restaurante com algumas pequenas mesas do lado de fora e uma aparência agradável. Algumas pessoas comiam ou bebiam algo por ali. Reparei em um pequeno latreiro em uma das paredes com os dizeres "Restaurante do Tony". Logo eu estava dentro do local e caminhei até a bancada, reconhecendo aquele homem mesmo estando de costas. Ele parecia ajeitar algumas garrafas em um enorme balcão. 
- Por favor, eu queria um sanduíche natural para a viagem... - pedi, vendo-o virar o corpo. 
- Claro, só um minut... Meu Deus! - o homem grisalho arregalou os olhos e se aproximou, me encarando como se eu fosse um fantasma. Eu sabia que estava pálida, mas não era para tanto. -Demetria? Demetria, é você? - comecei a rir e ele logo me acompanhou. 
- Acho que sou eu, Tony. - franzi o cenho, voltando a lembrar de alguns pensamentos. Aquela coisa toda de não saber mais quem eu era. 
- Você quer mesmo um sanduíche ou isso foi só para chamar minha atenção? - era simplesmente impossível não rir com os trejeitos daquele jovem senhor; tinha uma barriga saliente que era obrigada a se disfarçar graças à camisa branca que fora colocada para dentro da calça social preta. Os cabelos grisalhos penteados perfeitamente para trás. Ele tinha olhos que variavam entre o verde e o castanho e sempre estava com um sorriso no rosto. Disso eu me lembrava claramente. 
- As duas coisas! - deixei de sorrir e reparei que ele parecia ocupado, mesmo oferecendo toda a sua atenção a mim. - Tony, eu poderia... Falar com você? 
- Claro! Jimmy? - ele chamou alguém que estava dentro do que parecia ser a cozinha e logo um jovem garoto extremamente loiro apareceu. - Pode cuidar daqui por um tempinho? - sorri sem mostrar os dentes para o tal Jimmy e logo Tony deu a volta pelo balcão e se juntou a mim. Dei um leve abraço nele, me inclinando por ser mais alta. Tony era como meu avô, só que estava em melhor forma. 
- É bom estar por aqui. - falei, saindo do restaurante. 
- Você sumiu, garota! O que aconteceu? 
- Muita coisa, Tony. Você nem acreditaria se eu contasse. 
Passamos pelo meu carro e começamos a caminhar pelo rua do restaurante. Passavamos por várias casas cimetricamente iguais, exceto pela cor que variava de tons claros para tons escuros. Algumas crianças brincavam próximas a nós e eu respirei fundo, enquanto Tony parecia esperar que eu estivesse pronta para continuar a falar. 
- Eu fui ao cemitério. - ele me olhou e sua expressão se tornou triste. - Visitar o túmulo do Vincent. 
- Oh, Vincent! Aquele garoto continua fazendo falta, não? - concordei com a cabeça. - Menina Demetria, não quero parecer intrometido, mas tem algo incomodando-lhe? - um dos defeitos - ou qualidades - de Tony, era que ele conseguia ler as pessoas. Não adiantava fingir-se de feliz perto dele, tentar esconder um problema ou algo semelhante. Ele sempre sabia quando você precisava de ajuda ou de um simples conselho. Me lembrava das vezes em que o procurei em busca de conselhos para minha jovem vida que estava apenas começando. É, apenas começando. 
- Eu queria pedir um conselho, eu acho. 
- Ah! Eu estava sentindo falta de dar conselhos à garota das camisetas engraçadas! - ele juntou as mãos e eu gargalhei com a lembrança. - Em que posso ser útil dessa vez? 
Analisei tudo por um tempo, separando o que era aconselhavel comentar e o que não era. Encarei as luvas pretas em minha mãos e me senti aliviada por não ter que explicar nada relacionado a casamento. Por um lado eu até me sentia mal por Tony não ter comparecido no dia em que me casei com Joseph, mas não tinha mais jeito. E, bem... Casamento não era um assunto que eu gostaria de falar naquele momento. 
- Tony, o que uma pessoa faz quando ela simplesmente cansa? - não tinha entendido a minha pergunta. Seus lábios formaram uma linha reta e ele enrrugou a testa, com um olhar questionador. Continuei: - Mas não quer se livrar do que ama, mesmo que isso traga consequencias graves? O que fazer? 
Ele nem pensou para responder. Aquele homem não era normal. Sábio demais.
- Veja bem, Demetria... - prestei atenção em suas feições enquanto ele começava a falar. - Pessoas fracas iriam sucumbir-se a pensamentos pessimistas e desistiriam. Fugir é tão convidativo, não é? - sim, era. - Mas pessoas fortes como você... - apontou para mim, um sorriso terno fez as linhas de expressão aparecem. - Elas vão lutar e vão ser vitoriosas no final. 
- Você não perdeu todo aquele otimismo, hein? 
- Melhor otimismo em excesso, do que qualquer quantidade de pessimismo! 
- Mas e se essa pessoa não tiver conhecimento do que a espera? Ela vai lutar mesmo assim? 
- Nem sempre você pode enxergar a face de seu inimigo, Demetria. Mas você não luta para isso, você luta para provar a ele e principalmente a você mesma que é capaz. Vencer no final? Quem é que sabe... Mas se você cair, precisa cair sabendo que aqueles ferimentos significam que você pelo menos tentou. 
- Tony, obrigada! - abracei-o de novo, sentindo um imenso conforto com aquelas palavras. Como eu pude me distanciar de uma pessoa como aquela? 
- Não precisa agradecer, garota. Mesmo que você suma por mais uns cinco anos, eu vou estar disposto a lhe dar conselhos quando aparecer. Bom, pelo menos até eu ir fazer companhia a Vincent... 
- Isso ainda vai demorar muito! Então se cuide, está bem? - apertei a mão dele antes de dar adeus e voltar para a entrada do restaurante. Peguei meu carro e comecei a dirigir de volta para a casa. Para a minha casa. 


Assim que coloquei o carro na garagem e fechei a porta da mesma, me assustei ao perceber que Bethany estava parada do outro lado da rua, em frente a minha casa. Eu não a via desde o dia do casamento, e foi bom ver um rosto conhecido e amigo mais uma vez naquele dia. Caminhei sorridente até ela, mas Bethany não retribuiu meu sorriso. Ela parecia assustada e indecisa sobre como agir. Nos cumprimentamos com um beijo na bochecha e ela tentava disfarçar seu nervosismo de algum jeito. Olhei ao redor, para tentar achar o motivo que estava fazendo ela ficar daquele jeito, mas não tinha nada por perto. 
- Bethany, tudo bem? Como sabia que eu estaria aqui? 
- E-eu... Eu não sabia. Estava passando por aqui e vi você entrar na garagem com o carro. - ela começou a roer uma das unhas pintadas de vermelho que combinavam com seu cabelo ruivo e sua pele branca; seus olhos negros estavam bem maquiados e ela vestia um sobretudo preto. - Eu queria falar com você e... 
- Não, você não queria. Eu queria! - uma voz a cortou e eu senti meu coração acelerar quando percebi de quem se tratava. 
- Carter... - eu disse, tentando disfarçar meu susto. Um encontro com Carter era o que eu menos esperava naquele dia. E antes que eu pudesse pensar em correr e pedir socorro ou coisa parecida, ele se aproximou de Bethany e enlaçou seu braço no pescoço dela, adotando uma posição possessiva. Arregalei meus olhos com aquele feito, enquanto Bethany me olhava com medo. O que diabos ele fazia agarrado com ela daquele jeito e sorrindo para mim? - O que você está fazendo aqui? - tentei recuperar a calma. Ele largou ela e começou a andar em minha direção, passando por mim e dando uma volta completa ao redor do meu corpo. 
- Estive pensando... Talvez só aquela dica não tenha sido o suficiente. - conclui que ele só podia estar falando da tal coisa da clínica. 
- E então você vai me dar outra dica? - o desafiei. Que ótimo, mais encrenca de aproximando. 
- Vou! Mas antes... Meus parabéns pelas amizades competentes que você tem! - ele voltou a ficar do lado de Bethany e a mesma parecia desesperada. 
- Carter, por fav... - Bethany negava algo com a cabeça, mas ele a cortou. 
- Shh, eu não pedi para você falar. - ele foi tão rude com ela que até o meu orgulho se feriu. Que vontade de socar a cara daquele infeliz. - Bethany foi uma ajudante incrível... De várias maneiras, se é que me entende. - fitei os dois a minha frente e parei para refletir sobre as palavras do homem de olhos verdes e braço coberto por tatuagens. Ele me dissera anteriormente que alguém seguia meus passos, então... 
- Bethany? - perguntei, inconformada e Carter confirmou com um sorriso aberto. - Eu não acredito nisso! - ela evitava meu olhar e eu senti a raiva me dominar por dentro. Passei todo aquele tempo confiando nela como uma amiga. Envolvia ela em tudo que eu fazia com meus outros amigos, deixei que ela me ajudasse com os preparativos do casamento e toda aquela porcaria... Bem, pelo menos Carter serviu de algo positivo e me contou toda aquela palhaçada. Desviei meu olhar dela, antes que eu fizesse algo insensato e voltei a encarar Carter, esperando pela sua suposta dica. 
- Eu tenho um nome para você. Acho bom anotá-lo, porque não poderá se esquecer dele tão cedo. 
- Então, diga. 
Erin Fields
Revirei cada mínima memória a procura daquele nome. Sem sucesso. Pensei em questiona-lo, mas eu sabia que ele não diria mais nada sobre aquele assunto. Senti raiva. 
- Eu estou tentando entender o que você pretende com todas essas dicas... - a sensação de algo familiar em seu rosto me atraiu novamente e eu não conseguia parar de olhar. Ele deu um sorriso de canto e balançou a cabeça negativamente. Bethany observava tudo aquilo como uma criança assustada. - Seria muito bom se você parasse com isso! A minha vida estava normal, e então você,Cameron e essa ai... - apontei para Bethany com nojo. - Surgem de nada e começam a tentar ferrar com tudo. - dei um passo, me aproximando dele, que apenas esperava alguma reação minha. - Espera que eu aceite tudo isso em silêncio? Sem fazer nada? 
Carter soltou uma risada nasalada e seu braço coberto pelas tatuagens tratou de segurar o meu, o apertando com força. Engoli um grito ao sentir a forma agressiva como ele me segurava, era tão forte que eu sentia o local se adormecendo aos poucos. Olhei para Bethany, mas eu sabia que não podia pedir socorro à ela. Carter me olhou com os olhos verdes e extremamente penetrantes por um longo tempo. Me lembrou um psicopata, cheio de ódio e sem nenhum sinal de compaixão. 
- Dói, não é? - ele estava tão próximo de mim, praticamente sussurrava em meu ouvido. Depositou um pouco mais de força em meu braço e eu gemi de dor, pensando que Carter poderia quebrá-lo se quisesse. - Isso é apenas uma amostra do que eu posso fazer você sentir se ficar se metendo onde não deve. Minha prioridade é o Joseph, mas não me importo de matar dois coelhos com uma cajadada só. 
Fechei os olhos com força e aproveitei um pequeno descuido dele para levantar meu braço - o que exigiu um pouco de esforço - e acertar em cheio meu queixo em seu rosto. Não sabia muito bem como tinha conseguido fazer aquilo, acho que foi a adrenalina do momento. Ele se afastou um pouco de mim e passou a mão pelo nariz e boca, verificando se tinha sangue. Começou a rir de novo e adotou a posição superior de antes. Dessa vez ele não me tocou, pelo contrário, começou a se afastar. 
- Wow, ela sabe machucar! - disse alto. Ele puxou Bethany pelo braço e quando já estava em uma distancia considerável, quase chegando no carro que estava do outro lado da rua, apontou para mim. - Foi você quem pediu! 
Bethany me olhou por uma última vez, tentando me fazer acreditar que aquele olhar era arrependido. Como se eu fosse idiota. 
Assisti o carro se afastar e sumir por outras ruas, tentando me recuperar de tudo aquilo. Passei a mão pelo local que ficaria roxo por semanas e comecei a pensar naquele nome que ele tinha mencionado. 
Entrei correndo e tranquei a porta, repetindo aquele maldito nome em voz alta enquanto subia para o quarto. 
Erin Fields. Erin Fields. Erin Fields. Quem diabos era Erin Fields? 
Xinguei a parede quando percebi que meu notebook não estava naquela casa. Eu poderia pesquisar no google e ver quem era a dona daquele nome. Então fui até a gaveta do criado-mudo e peguei uma caneta. Livrei-me rapidamente das luvas e tirei o casaco de couro, erguendo uma das mangas da camisa. Anotei o nome em meu braço - o que não fora machucada - por causa da falta de papel ao redor e desci as escadas correndo, tirando meu celular da bolsa e procurando por um número que poderia ser útil. 
Eu não tinha muitas opções. Jared e Cassie ainda deveriam estar na Empire, e eu não voltaria para lá de jeito nenhum. Bethany era uma traira e naquele momento eu quase desejava sua morte. Peter, meu irmão, estava na Suíça com minha mãe, mas meu celular não tinha bateria o suficiente para uma ligação como aquela, porque era uma certeza de que minha mãe tomaria o celular de Peter e o breve assunto se estenderia. 
- Alô? - Caleb atendeu com uma voz sonolenta. 
- Oi Caleb! É a Demetria. 
- Hey, tudo bem? 
- Hm... Não sei, eu preciso de uma ajudinha sua, se for possível! 
- Ajuda?
- É, eu queria me encontrar com você e preciso que leve seu notebook. 
- Tudo bem, mas eu posso saber o motivo disso? 
- É uma pesquisa. - expliquei, ouvindo-o concordar. Combinamos de nos encontrar em uma cafeteria que ficava perto de minha casa e então eu desliguei o telefone, saindo de casa novamente. Dia agitado. 

Perdi a paciência e comecei a beber meu café sem esperar por Caleb. Quando estava nos últimos goles, ele chegou todo desajeitado e colocou seu notebook sobre a mesa que eu tinha reservado para nós dois. Nunca me senti tão feliz ao ver um notebook em minha vida. Não, eu não estava feliz, mas senti que pelo menos uma coisa estava dando certo. 
Nos cumprimentos com acenos de cabeça e ele retirou as luvas, agradecendo por eu ter pegado um café para ele também. Caleb parecia o personagem nerd de um filme de ficção científica; tinha o físico magro - não esquelético, mas magro -, era apenas alguns centimentos mais alto do que eu, tinha cabelos castanhos que formavam cachos pequenos e mal feitos, olhos castanhos e usava óculos de grau. Aparência estranha para o filho de um polícial, talvez. Tirei a jaqueta novamente e ergui a manga da camisa. O nome estava meio apagado em minha pele, mas ainda estava ali. Caleb me olhou confuso e abriu seu notebook, digitando rapidamente algumas coisas. Terminei totalmente meu café e ele olhou meu braço, franzindo a testa ao tentar ler o que estava escrito. - Por que o nome Erin Fields está escrito no seu braço? - ele quase ria. Pensei. Eu não podia dizer que um cara que estudou comigo na adolescencia surgiu anos depois e começou a me dar dicas estranhas que envolviam o passado de Joseph. Primeiro que ele não entenderia, segundo que ele era o filho de um polícial que aparentava ser bem linha dura. 
- Preciso pesquisar sobre esse nome... - olhei ao redor, procurando por palavras. - É uma autora de livros, gostaria de saber mais sobre ela. - que mentira horrível. Caleb continuava a encarar o nome, perdido em pensamentos. - Caleb? 
- Ah, então... - saiu de seu transe e começou a digitar rapidamente, o teclado fazia um barulho alto devido a rapidez com que seus dedos digitavam. - Erin... - olhou mais uma vez para o meu braço, procurando pelo sobrenome. - Fields... 
Observei seu rosto sem expressão, enquanto ele tinha os olhos presos na tela e procurava por algo. 
- E então? 
- Não tem nada. 
- Nada? 
- Não... Deve ser uma escritora bem desconhecida. - ele levantou uma das sobrancelhas. Óbvio que ele sabia que eu estava mentindo sobre a parte de ser uma escritora. 
- Droga! - coloquei uma mecha de cabelo atrás da orelha, balançando minha perna freneticamente. 
- Sabe, esse nome não me é estranho... - Caleb olhou para dentro do café e seus olhos cobertos pelo óculos pareciam procurar por algo que não existia. - Preciso lembrar! 
- Tudo bem, qualquer coisa você pode me ligar. 
- Sim, mas caso eu não consiga algo ainda hoje sobre essa coisa que você não quer me contar, podemos conversar melhor sobre isso na festa da Cassie. - eu sabia que ele não tinha engolido a história da escritora. 
- Claro, a festa de Halloween da Cassie... - bufei com aquele lembrete. 
- Você vai, né? 
- Claro, quem não adora o Halloween? 
E no meu Halloween, os monstros seriam de verdade. 

Dancing with the devil's past has never been too fun.

Um comentário:

  1. Aiiii a Demi vai se separar do Joe? Aiiii que drogaaan, eles nao tem sossego algum, que merdaaaa,ms ta perfeito posta logoooo

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Sem comentario, sem fic ;-)